Tentativa de concluir algo acerca da condição dos elfos domé

Seção reservada para discussão das colunas do Site Potterish.

Moderators: Marcelo, Cronista

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Sheila Vieira

Tentativa de concluir algo acerca da condição dos elfos domé

Post by Sheila Vieira »

Um dos personagens mais importantes no filme “Relíquias da Morte – Parte 1” foi o elfo Dobby, que havia aparecido apenas em “Câmara Secreta” nas telas, mas frequentou boa parte da história de Harry Potter nos livros. No entanto, o que a coluna de hoje do Potterish quer discutir é a posição dos personagens (e a falta dela na narração) em relação à escravidão dos elfos.

Enquanto a maioria dos bruxos via a escravidão de elfos como algo natural e parte da natureza daqueles seres, outros se revoltaram, como Hermione. No entanto, mesmo com a libertação de Dobby, a questão dos elfos não terminou com um tom muito positivo na narrativa. Afinal, qual mensagem Rowling quis deixar com essa parte da história?

Confira a coluna de Mariana Nascimento e dê o seu pitaco!
Daniel

Re: Tentativa de concluir algo acerca da condição dos elfos domé

Post by Daniel »

Acho de uma colossal e asquerosa ignorância que em pleno século XXI se admita que a submissão e a escravidão é própria da natureza de uma raça.

A experiência de Jo na Anistia Internacional fez ela conhecer algo sobre isolamento, luta e repressão, ela soube lidar
bem com isso. A visão inicial que temos de Dobby é a de uma criança de 12 anos que ainda pouco sabe da história da magia e de tudo que ocorre nesse outro universo. Harry vê a criatura com total estranhamento, ele não entende a atitude de Dobby e tem alguma sensibilidade pela sua condição miserável porque é um menino de bom caráter. Rony é o garoto que cresceu com aquela condição ao seu redor, admitindo então que aquilo é natural, já que não tem muito senso político. Hermione, como a menina estudada e a frente do seu tempo que é, pode compreender a situação e levantar a bandeira pela libertação. E eu posso apostar que ela sabe tudo que consta sobre a origem dos elfos...

O paralelo dessa codição de olhos fechados pra condição dos elfos é muito clara pra mim. Tenho algum envolvimento com a luta pelos direitos dos animais e a situação é a mesma. As pessoas comuns simplesmente ignoram que está ocorrendo algo terrível, preferem fechar os olhos pra qualquer coisa que ameace o seu conforto e bem-estar. É o fácil em detrimento do certo, como disse Dumbledore. É por isso que ninguém precisa saber que quem mantem aquele castelo é uma raça oprimida e invisível, sem reconhecimento pelos seus esforços, sem identidade, sem nada. Por isso que a cozinha é um esconderijo. A condição é levada a tal ponto que a vítima reconhece aquilo como natural. É a alegoria da caverna platônica. Por isso que o elfo se auto-flagela e tem a posição sempre subserviente. Submissão como natureza do indivíduo não faz o menor sentido.

Acima dessa discussão, podemos olhar também para a origem do personagem. Dobby é o nome de uma mulher na autobiografia de Jessica Mitford, membro do Partido Comunista (confiram no fanzone). Jessica é a escritora que mais influenciou J.K Rowling (conferir nas entrevistas traduzidas do ish, pela busca). Ora, a história e os ideais do comunismo pode trazer paralelos interessantes à condição de Dobby e sua evolução na série, bem como sua morte trágica durante a luta para derrubar o nazismo de Voldemort, mais do que isso, pelo mais importante companheiro do elfo - Harry. Algumas palavras de Rowling que ouso correlacionar com essa referência: "Para mim a morte de Dobby despertou Harry para o que ele estava fazendo.” No caso, seriam a Relíquias da Morte, que fariam de Harry o Mestre de algo que está acima da natureza humana, uma obsessão quase voldemortiana. Totalitarismo comunista?

Por que um elfo? Pra mim isso faz parte do senso irônico de Rowling (que, entre outros, transforma mártires católicos em bruxos). Os elfos são mais comumente relatados como seres de longevidade, imponência e dotes sobrenaturais. Os duendes de Rowling a mesma coisa... em Relíquias descobrimos que eles poderiam mesmo portar varinhas! Além de tudo, são seres em defesa da floresta, bem deste planeta que tem sido destruído e pelo qual se luta hoje em dia.

Acho importante também adicionar que a luta pelo FALE continuou após a guerra, Hermione teve sucesso pela classe dos elfos, pela classe daqueles que não tinham voz.

No mais, coluna instigante. Eu quis fazer essas ligações extra-literárias porque acho que dá um bom debate, já que a Rowling alegoriza tão sutilmente as coisas que muitas vezes podem passar despercebidas.
RodrigoP

Re: Tentativa de concluir algo acerca da condição dos elfos domé

Post by RodrigoP »

A analise está muito boa, com toda a certeza, mais acho que alguns dos leitores não percebem que em finais de grandes séries, os grandes autores optam por deixar aquele fato sem uma conclusão dada por ele, e assim oferecem a chance aos leitores de imaginar o que ela quis passar com aquilo.
Li algo sobre o Grande JRR Tolkien, e era mais ou menos assim: "Tolkien em seus finais opita por um final conclusivo e satisfatória, passando belas menssagens, mais não se abstem de deixar um gosto amargo na boca dos leitores, e assim conquista ainda mais fãs."
Juane

Re: Tentativa de concluir algo acerca da condição dos elfos domé

Post by Juane »

Com certeza foi uma analogia. A concordo com o testa da Mariana. O problema é como as pessoas lidam com isso.
A Hermione, como sempre, está a frente dos outros da sua idade e possivelmente do seu tempo, e teve uma atitude super bacana.
Mas eu acho que a escolha de não ter um elfo, já é valida.
Mas é claro, que assim como é mais fácil para as pessoas fingir que não sabe como o seu tênis Nike é feito, e compra-lo assim mesmo, também é mais fácil fingir que os bruxos não se dão conta da exploração que fazem com os elfos. :|
Nanda Weasley

Re: Tentativa de concluir algo acerca da condição dos elfos domé

Post by Nanda Weasley »

A coluna ficou muito boa. Para mim os elfos domésticos foram vítimas de uma lenta e constante "educação", por assim dizer, por parte dos bruxos, que os adestrou a serví-los e os fez acreditar que aquilo era próprio de sua raça, tanto que aquilo realmente acabou se tornando parte de sua natureza. Mas é claro que isso pode ser revertido (ou melhor, corrigido). Lembro daquela frase da Hermione em Relíquias da Morte em que ela diz que a história bruxa muitas vezes passa por cima de outras raças mágicas (algo assim).
Mas realmente a "mensagem" que o livro passa é que, não importando a origem, o importante é o que fazemos agora para mudar essa situação. A maioria dos bruxos, alienados, prefere ficar em sua zona de conforto e simplesmente fechar os olhos. Hermione, como uma pessoa sábia e revolucionária, tenta fazer alguma coisa (e sim, segundo Rowling, posteriormente ela consegue).
Adoro essas analogias da saga com a história, como a condição dos elfos aos ideais comunistas (como bem colocou Daniel) e a comparação de Voldemort a Hitler e seu ideal de purificação dos raças.
Feanaro_Ciryatan

Re: Tentativa de concluir algo acerca da condição dos elfos domé

Post by Feanaro_Ciryatan »

Realmente esse é um assunto muito bom e bem amplo, há muito o que falar dele hehe, inclusive já li um livro que tinha um capítulo inteiramente destinado aos elfos e ao F.A.L.E.

Eu não creio que a subjugação dos elfos domésticos seja naturalmente racial, embora acredite que ela foi induzida.
Os elfos domésticos demonstram todos os sinais de ter vontade própria, Monstro sempre tentava surrupiar algum objeto dos Black que seria jogado fora, Winky foge da barraca em chamas e se recusa a receber salário de Dumbledore, Os elfos da cozinha se distanciam de Dobby e expulsam Harry, Rony e Hermione quando ela os "ofende" e sem contar tudo o que Dobby fez contra a vontade dos Malfoy.
Com isso, os elfos deveriam ter todo o tipo de proteção moral que se dá aos demais seres humanos, porque eles são capazes de raciocinar. Isso é um forte indício de que não é realmente natural deles se humilhar a qualquer ordem dos amos e mostra que é moralmente errada essa escravidão.

Eu creio (Se Bagman estivesse aqui já estaria coletando o dinheiro de bastantes apostadores sobre esse assunto hahaha) que a escravidão dos elfos domésticos foi induzida, ou seja, a raça [a muitos e muitos anos atrás (não sei de quando datam as primeiras evidências de escravos elfos)] foi enfeitiçada. Muito provavelmente, os bruxos antigos, em épocas em que a moralidade não estava nada desenvolvida, lançaram um encantamento extremamente poderoso na 'raça' dos elfos (não nos indivíduos), algo como a maldição 'Imperius' que afetou toda a espécie. E isso seria perfeitamente possível, pois há feitiços que agem de forma semelhante nos livros: como a maldição 'Imperius', que escraviza quem foi atingido; o feitiço 'Fidelius', que afeta todos os bruxos (e trouxas) impossibilitando-os de encontrar tal lugar; o feitiço do 'Tabu', que amaldiçoa um som, fazendo com que qualquer um que pronuncie tal palavra seja imediatamente localizado e exposto; e até mesmo o possível encantamento lançado por Voldemort no cargo de Defesa Contra as Artes das Trevas que afetou todo o cargo por tempo indeterminado.

Os primeiros escravos provavelmente eram muito mais 'forçados', como sob o efeito da maldição 'Imperius', porém, com o passar de milhares de anos, o feitiço foi enfraquecendo devido ao tempo, às gerações e ao número de elfos domésticos, como ocorre também com a maldição 'Imperius' em menor escala (O que permitiu Bartolomeu Crouch Jr. se livrar dela e incriminar Winky na Copa Mundial de Quadribol de 1994). Esse suave enfraquecimento veio possibilitando os elfos a usufruírem mais do próprio livre arbítrio e recobrando a capacidade de raciocínio.
Igualmente aos humanos, há elfos mais resistentes contra esse tipo de maldição. Da mesma maneira que Harry consegue resistir à maldição 'Imperius', Dobby conseguiu atenuar os efeitos desse forte e antiquíssimo encantamento. Com a forte convicção de salvar Harry, Dobby conseguiu, até mesmo, escapar dos Malfoy, surrupiar as cartas, aparatar na rua dos Alfeneiros dentre tantas outras coisas. Essa convicção o ajudou a resistir a esse encantamento de forma análoga à fuga de Sirius de Azkaban (com o intuito de encontrar Pettigrew).

Mesmo assim, da mesma forma que muito poucos conseguem resistir à maldição 'Imperius’, quase nenhum elfo consegue resistir ao encantamento ancestral. Assim, conjugando tal encantamento com o fato de que os novos elfos observam há séculos a família inteira deles se comportar dessa forma e ser tratada assim, realmente acreditam que é o destino deles. Os bruxos, por sua vez, observam seus semelhantes há séculos escravizando os elfos domésticos, mesmo que acreditem ser errado, crêem que é assim que deve ser porque 'sempre foi assim' e eles 'gostam' disso. Ou seja, a lavagem cerebral está completa.

E aí entra a analogia com a alegoria da caverna de Platão, como comentou Daniel. O feitiço é tão forte, tão ancestral e há tanto os elfos observam esse tratamento, que simplesmente não conseguem imaginar como seria estar livre. E os que se libertam (saem da caverna) sem estar preparados podem enlouquecer, se cegar com a luz de fora da caverna, como ocorreu com Winky. Winky estava tão arraigada ao feitiço, tão presa às vontades da família Crouch que quando foi libertada simplesmente definhou.

E ainda assim, o suposto encantamento ancestral é tão poderoso que não se quebra simplesmente com a liberação do elfo, os resquícios dele continuam afetando até os libertados (isso também ocorre com a maldição ‘Imperius’ quando os alunos, depois da aula do falso Moody, saem dando saltos passo sim passo não). Mesmo depois de ser demitida, Winky ainda acredita que deve servir o Sr. Crouch e até mesmo o bravo Dobby involuntariamente travou a língua e se jogou na parede quando falou mal do Sr. Malfoy quase DOIS ANOS depois que fora libertado.

Se esse for o caso acho que simplesmente ordenar que eles se sintam livres não basta, porque ainda assim eles seriam escravos e bruxos como os Malfoy poderiam simplesmente ‘esquecer’ de ordenar isso a eles e continuaria tudo como está. Obrigá-los a ordenar isso também não daria certo, pois o elfo não aceitaria a ordem, primeiro porque não acredita nela (acha que é certo ser escravo) e segundo porque sabe que essa não é a real vontade do amo, usaria o pouco de livre-arbítrio que tem para ignorar essa ordem. O que poderia funcionar seria juntar bruxos realmente poderosos (pena que o maior deles não está mais entre nós...) para tentar reverter esse encantamento ancestral ou tentar reduzir os efeitos dele o suficiente para que os elfos possam responder por si mesmos sem se castigar involuntariamente.

Vixe, vou parar por aqui senão escrevo um livro, acho que me empolguei um ‘pouco’ hehe, quase escrevi outra coluna.
E tem muuuito o que falar desse assunto ainda...

Ótima coluna, assunto instigante, polêmico, daria um ótimo debate mesmo...
mari

Re: Tentativa de concluir algo acerca da condição dos elfos domé

Post by mari »

Eu não concordo com a idéia de ser a "natureza deles"

Tanto que como disseram acima eles mostravam vontade própria, e quando esta antagonizava aos dos seus "senhores" se puniam de forma doentia...

Monstro mesmo só serviu ao Harry lealmente quando criaram uma espécie de laço, não era uma obediência cega ou inata, eu acho que o que existia principalmente era uma lavagem cerebral mesmo, eles tinham medo de desobedecer e ficar à margem, serem discriminados, e simplesmente perderem seu local na sociedade...

A escravidão dos elfos chegou num ponto de alienação total por parte deles, e da grande maioria da sociedade bruxa, poucos se importavam, a maioria concordava com o abuso dos elfos, e os que não concordavam eram omissos...

Admirei muito a atitude da Hermione, ainda tão nova, e seu engajamento segundo a JK deu resultado no futuro. Garantindo os direitos e melhorando as condições de vidas dos elfos.

Era um absurdo o que ocorria, totalmente revoltante...
Lilian T.

Re: Tentativa de concluir algo acerca da condição dos elfos domé

Post by Lilian T. »

Uma das melhores colunas que já li aqui no Ish!

Daniel [2]

Acho que a maioria dos leitores sempre teve suas duvidas quanto ao papel do elfos na serie. A tia Jo inteligente como sempre foi criou um universo bruxo que servia em parte como uma critica ao nosso próprio universo trouxa, e não raramente conseguíamos distinguir alguns elementos bem claros, como a arrogância da elite, o abuso e cegueira do governo e os políticos, o preconceito com o que é diferente, entre outros. No entanto a condição dos elfos domésticos nunca foi realmente clara. Faço minhas as palavras de Rodrigo, ao dizer que essa foi mais uma das grandes sacadas de Rowling que deixou que tirássemos nossas próprias conclusões sobres os elfos.

Não acredito que os elfos tivessem mesmo uma propensão para escravidão, até porque ninguém no mundo tem isso. Os elfos são seres que gostam da satisfação do trabalho cumprido e do bem estar de quem está sob “seus cuidados”, como os bruxos. No começo essa deveria ser a principal razão de seus serviços. Mas é claro que sendo os bruxos seres arrogantes, acomodados e pretensiosos como vimos na serie que são eles exploraram a inocência, a humildade e os esforços dos mais fracos.

Concordo com a teoria do Feanaro quando ele argumenta que deve haver um feitiço ancestral lançado sobre os elfos, mas não sei realmente se ele foi feito para abranger toda a raça dessas pobres criaturinhas. Eu imagino que o principio da relação entre elfo e bruxo tenha ocorrido como as relações de suserania e vassalagem tipos dos reis e camponeses trouxas. Acho que no começo os bruxos e os elfos tinham uma relação de dependência um do outro: o bruxo necessitava de um criado obediente e competente para realizar tarefas que eles que talvez não tivessem tempo de fazer ou considerassem indignas de sua condição de nobre ou sangue puro. Enquanto isso, os elfos deveriam ter os mesmos interesses que os camponeses trouxas tinham, como proteção, trabalho, abrigo, etc.

Creio que o feitiço não funciona na mesma base da Maldição Imperius, mas seja do mesmo tipo que o Cálice de Fogo: um pacto contratual mágico, que mantenha o elfo sob as ordens do bruxo e torne o bruxo responsável pelas ações do elfo. Obviamente os elfos, que em sua maioria tem um temperamento dócil e gentil, não se rebelariam contra as pessoas que acreditava serem dependentes dele para ajudar e cuidar (um exemplo desse comportamento são os sentimentos de Winky). Entretanto, o mesmo não se aplica aos bruxos, que temendo serem constrangidos por possíveis atitudes desleais dos servos ou apenas querendo garantir o máximo controle sobre quem mora em suas casas, deveriam tratar os elfos com muito rigor. Os maus tratos deveriam ser rotina amo e servo para mostrar aos elfos a quem deveria ser realmente obedecido, além da suposta educação a que talvez fossem submetidos para creditar que aquele era seu lugar e sua obrigação.

Isso explicaria muito sobre as atitudes de um e de outro. Um elfo não pode falar mal de seu senhor, nem revelar os segredos da família a que serve, e deve se castigar se desobedecer às ordens, pois a ordem do senhor é a lei máxima do elfo. Pois bem, o bruxo tem apenas a obrigação de se responsabilizar pelo elfo e suas atitudes, pois o elfo apenas cumpre as ordens do senhor... É claro que há casos de elfos condenados a Azkaban (Hóquei), mas isso porque atentou contra a vida de seu amo, um bruxo (ou assim o Ministerio-de-Só-Tem-Babaca-acredita).
A 1° coisa que chama a atenção foi o fato de Jo ter mudado o paradoxo de elfos altivos, belos e imortais. Porque ela não seguiu a modelo habitual? Para mim, foi justamente para deixar ainda mais claro o tratamento destinados à esses seres. Nada mais poderia ser tão impactante quanto ver o que acreditávamos ser algo incrível e fantástico reduzido ao simples e quase insignificante. É como se acordássemos de um sonho e víssemos a realidade como ela é em sua totalidade. É como uma viagem a India: esperamos o Taj Mahal e o rio Ganges e encontramos pessoas pobres mendigando. Acho que Jo não podia fazer uma alegoria melhor.
Mas qual é a colocação dos elfos no contexto do mundo trouxa? Bem, acho que é justamente o fator de exploração do mais humilde. A gente pode pensar que não há escravidão como a dos elfos em um mundo dominado pela globalização e igualdade, mas é isso mesmo que cria tanto distanciamento entre as classes: alguns são muito ricos e outros muito pobres. Há centenas de lugares que ainda convivem com a escravidão, a exploração de mão de obra infantil e condições de vida sub-humanas (a questão da Nike é apenas mais uma que foi lembrada). As pessoas que enfrentam isso estão no mesmo lugar que os elfos domésticos: foram educadas para acreditar que aquele é o lugar que lhes cabe e nada além daquilo lhe é merecido; estão de mãos atadas e não podem se rebelar contra seus opressores; sofrem com a acomodação e preguiça das pessoas que tem o poder de ajudá-las.

Existem milhares de elfos domésticos no mundo trouxa, e no final, nós somos os bruxos que os acorrentaram as algemas, tanto físicas como psicológicas, com o nosso descaso e cegueira. Nós somos como Ron, e acreditamos que aquela é a ordem natural da sociedade e não há nada de errado, e que tudo deve permanecer, pois é confortável para nós. Somos como Harry e nos indignamos quando vemos uma pessoa sofrer; nos a ajudamos da forma que podemos, mas esquecemos de que há outras como ela que também precisam que façamos algo por elas. Somos Hermione, que enterrada em nossos livros e nem tomamos o conhecimento do sofrimento alheio, no entanto, quando vemos o problema, nos lutamos e resolvemos o fato.

Comentario em homenagem a Dobby, um elfo livre!!!
Feanaro_Ciryatan

Re: Tentativa de concluir algo acerca da condição dos elfos domé

Post by Feanaro_Ciryatan »

Uma das melhores colunas que já vi no Ish [2]
Fantástico o assunto e estupendo debate.

Achei interessante a colocação da Lilian de um ato contratual mágico, mas ainda imagino que seja algo maior (mais poderoso ainda) porque não creio que a escravidão tivesse sido de "boa vontade". Partindo do ponto em que não se acredita ser da natureza deles a servidão cega, não há porque imaginar que eles realmente quisessem firmar um contrato mágico que os escravizaria por toda a eternidade. Isso, considerando: a grande inteligência, grande força de vontade e o grande poder mágico dos elfos, muitas vezes superior ao dos próprios bruxos, já que conseguem aparatar em qualquer lugar independentemente de proteções mágicas e conseguem lançar feitiços sem o necessário uso de varinhas. Também, pelos motivos anteriores, não acredito que precisem da proteção nem da alimentação dos bruxos, já que possuem suficiente inteligência, independência e poder para viver longe deles, como no caso dos centauros e sereianos.

Acredito que seja algo mais poderoso, porque, no caso de um ato contratual mágico, apesar de o ato os tornar obrigados a obedecer, não creio que os elfos seriam arrastados como títeres, involuntariamente. Ainda mais depois de o contrato ser, há muito, desfeito. Talvez esteja enganado, porque não temos muita informação nos livros sobre atos contratuais mágicos. Pelo menos, Harry não foi arrastado se chocando com as paredes para participar do torneio Tribruxo, cogitou, inclusive, a não participar da segunda tarefa, pois não conseguira encontrar uma maneira de respirar em baixo da água. Se não fosse o maravilhoso Dobby a roubar o guelricho acredita-se que seria isso o que ele teria feito.

Ainda assim, se fosse um simples (ou complexo) contrato, haveria diferenças no comportamento dos elfos domésticos, sobretudo com o passar dos séculos. Famílias diferentes tratariam os servos de formas diferentes, algumas os obrigariam a se castigar severamente, outras não. Nos tempos modernos, as famílias contrárias ao 'sistema' (como os Potter), talvez não optassem simplesmente por não ter um elfo doméstico, e sim fariam um contrato mais brando e tratariam o empregado com dignidade, o que parece não ser possível. Provavelmente deveriam ordenar que não se castiguem e ainda assim segurá-los para impedir os movimentos involuntários (como aconteceu algumas vezes com Dobby).
Se os castigos fizerem parte do contrato e se ele for forte o suficiente para acarretar movimentos involuntários, chegamos novamente perto dos efeitos da maldição imperius.

Continua, porém, o fato dos elfos livres. No caso de um ato contratual mágico ou de um feitiço ancestral que não se aplicasse a toda a raça, deveria haver comunidades de elfos livres, sobretudo depois de eles observarem o destino dos elfos que fizeram o contrato. Se levantarmos a hipótese de que os elfos livres, ainda assim, firmaram o contrato, estaríamos admitindo que a servidão é natural deles. E se foram obrigados a isso, os elfos não seriam tão 'contentes', teríamos muito mais casos parecidos com o do Monstro, que obedece às ordens, mas resmunga e não gosta.
Por outro lado, a hipótese do encantamento ancestral em toda a raça já explicaria isso tudo, inclusive a uniformidade de comportamentos. Tanto que a alegria extrema é um dos efeitos relacionados à maldição imperius, esse efeito também poderia estar adicionado no encantamento ancestral. Embora, acredito que os antigos elfos livres eram igualmente felizes sem contrato ou feitiço algum.

Agora, juntando as duas teorias, poderíamos imaginar em algo como um ‘abuso de boa fé’. Os elfos, com sua bondade, sentimento de satisfação do trabalho cumprido e do bem estar daqueles a quem ajudam (como comentou Lilian), juntamente com a opção de não viverem isolados, decidiram se aliar aos bruxos para ajudá-los nas tarefas domésticas. Provavelmente essa ajuda seria em troca da inserção na sociedade, de salário e também pela satisfação de ajudar. Porém, deve haver acontecido algo que desestabilizou esse acordo, provavelmente a arrogância dos bruxos, sentimento de superioridade conjugado com algum afrontamento em que algum elfo não conseguiu, ou não quis cumprir o que o bruxo necessitava. Os bruxos provavelmente perceberam que enfeitiçando os elfos (o que, na visão deles, não seria nada de mais, pois seria como adestrar um cão) conseguiriam fazê-los cumprir o que ordenavam com muito mais aptidão, eficácia e eficiência e sem a necessidade de pagar-lhes nada.
A isso, pode haver se seguido uma ação que escravizaria os elfos (toda a raça) aos bruxos por meio de um encantamento, o que também não seria ao todo incoerente. Para a época, essa ação, talvez fosse algo como a exterminação e expulsão dos gigantes que ocorreu provavelmente muitos séculos depois.

Talvez seja uma hipótese um pouco mirabolante, mas é coerente, talvez precisemos de mais algumas teorias para ir montando o ‘quebra-cabeça’ e continuar na ‘tentativa de concluir algo acerca da condição dos elfos domésticos’

Desculpem por novamente ater-me a somente um assunto (a condição dos elfos em si), mas, como o tema é tão amplo, se fosse abranger a todos (o paralelo ao mundo dos trouxas etc) seria muito a escrever hahaha. Espero que o debate continue para tentar chegar à melhor conclusão possível acerca da condição dos elfos domésticos.
Mariana N.

Re: Tentativa de concluir algo acerca da condição dos elfos domé

Post by Mariana N. »

Achei muito interessante a teoria sobre um feitiço capaz de afetar toda a raça dos elfos. Porém, discordo do argumento dos que não acreditam ser a obediência inerente aos elfos simplesmente porque isso não existe. É claro que a série guarda paralelos com a realidade, mas seria perfeitamente verossímel se, em um mundo em que alguém divide sua alma e um pássaro renasce das cinzas (apenas para ficar em dois exemplos), houvesse criaturas caracterizadas pela obediência extrema. Estamos falando de um mundo mágico, em que coisas extraodinárias podem acontecer, desde que sejam coerentes dentro da lógica desse mundo.

Em relação à aparência dos elfos de "Harry Potter", gostaria de lembrar que ela só pode ser considerada uma quebra de expectativa se for comparada à de elfos como os de "Senhor dos anéis",já que a aparência dos elfos varia de obra para obra:
"São criaturas mitológicas do folclore celta e escandinavo presentes, portanto, nas lendas de países como Grã-Bretanha, Noruega e Suécia. Nessas histórias eles usam seus poderes mágicos para aprontar travessuras e são quase imortais: só morrem se forem assassinados, imunes à velhice e às doenças. Na maioria dos relatos, surgem como anõezinhos de orelhas pontudas, mas, dependendo da região de origem da lenda, assumem formas que vão de espíritos protetores da natureza a anões pretos, cinzentos ou brancos. "A raiz do nome elfo, alf, é a mesma de 'alvura', o que indica um caráter positivo", diz o historiador Hilário Franco Júnior, da USP. As histórias, porém, nem sempre mostram elfos bonzinhos. Os Edda, coleção de textos da mitologia escandinava do século XIII, trazem três tipos: os brancos, bons, e os negros e cinzentos, perversos, afirma Verlyn Flieger, professora de Mitologia Comparada da Universidade de Maryland, Estados Unidos.

Com a expansão européia do Cristianismo, os elfos acabaram demonizados, mas essa imagem foi virada ao avesso pelo escritor J.R.R. Tolkien na trilogia O Senhor dos Anéis (1954), em que os elfos são belos e sábios, parecidos com humanos de estatura elevada." http://super.abril.com.br/superarquivo/ ... 0727.shtml

E continuemos tentando concluir algo acerca da condição dos elfos domésticos! \o/
b´´´

Re: Tentativa de concluir algo acerca da condição dos elfos domé

Post by b´´´ »

só o ish mesmo para, mesmo com o fandom "congelado", nos brindar com textos brilhantes e inteligentes.
melhor fansite de hp, sem dúvidas. <3
Feanaro_Ciryatan

Re: Tentativa de concluir algo acerca da condição dos elfos domé

Post by Feanaro_Ciryatan »

Por absurda coincidência encontrei uma informação interessante:

Estou lendo os livros de Harry Potter pela ‘já-perdi-a-contésima’ vez e, ontem (re-lendo a Ordem da Fênix), tropecei a leitura em uma frase, sutil, mas muito interessante que não tinha reparado (ou pelo menos não tinha visto com os ‘olhos’ desta discussão).

Em Harry Potter e a Ordem da Fênix, página 671, sétimo parágrafo, quando Dumbledore está explicando a condição de Monstro ao trair Sirius:

“... Veja, Monstro não conseguiu nos trair inteiramente. Ele não é o Fiel do Segredo da Ordem, não poderia informar aos Malfoy o nosso paradeiro, tampouco os planos confidenciais da Ordem que ele fora proibido de revelar. Estava impedido por encantamentos próprios a sua espécie, o que quer dizer que não podia desobedecer a uma ordem direta do seu dono, Sirius. ...”

Dumbledore afirma que Monstro estava impedido por “encantamentos próprios a sua espécie” o que indica que realmente a “espécie” dos elfos domésticos está enfeitiçada!!!

Isso não comprova 100% a teoria do encantamento ancestral, mas é um bom argumento a favor dela e principalmente um fortíssimo argumento contra a ‘escravidão por natureza’.

Acredito que daqui a pouco conseguiremos fechar uma boa teoria e agora sim estamos cada vez mais perto de chegar a uma conclusão acerca da condição dos elfos domésticos. \o/
Mariana N.

Re: Tentativa de concluir algo acerca da condição dos elfos domé

Post by Mariana N. »

Realmente, foi um grande achado, Feanaro! Porém, não sei se a frase possibilita uma conlusão, já que me parece ambígua. Se o termo "encatamento" dá a entender que os elfos estão enfeitiçados, a expressão "próprios à sua espécie" parece indicar que o encatamento é dos próprios elfos, e não de uma fonte exterior a eles.

Se tomarmos "encantamento" como sinônimo de "magia" ("impedido por magia própria a sua espécie"), acaba parecendo que a lealdade/obediência é um traço inato, assim como a magia que faz um testrálio ser invisível a determindas pessoas é inata a essas criaturas, por exemplo.

Ao meu ver, se os elfos fossem enfeitiçados, uma frase clara a esse respeito seria mais ou menos assim: "ele foi impedido por encatamentos lançados contra sua espécie" ou "ele foi impedido por encatamentos que atingem sua espécie".
:?
Feanaro_Ciryatan

Re: Tentativa de concluir algo acerca da condição dos elfos domé

Post by Feanaro_Ciryatan »

Os livros em inglês estão bem escassos por aqui, demorei bastante e não achei em nenhuma livraria que procurei, mas, por sorte, achei o trecho na internet ;)

A tradução da Lia está bem boa:

"... You see, Kreacher was not able to betray us
totally. He is not Secret Keeper for the Order, he could not give the Malfoy's our
whereabouts, or tell them any of the Order's confidential plans that he had been forbidden to reveal. He was bound by the enchantments of his kind, which is to say that he could not disobey a direct order from his master, Sirius. ..."

Infelizmente acredito que isso não tira a dúvida, a frase pode indicar as duas possibilidades (embora desta vez aparenta tendenciar mais para o lado inato da obediência, como a magia dos testrálios).

Embora, como disse, não indica nada, pois a frase ainda está um pouco ambígua (Poderia ser mais clara como: "... enchantments for his kind" ou "... enchantments, characteristic of his kind") e ainda cita um 'encantamento', creio que um encantamento é algo imposto não inato, do contrário seria "por sua própria magia".
De mesmo modo que os testrálios não foram encantados (não estão sob o efeito de um encantamento) eles ficam invisíveis por sua própria magia, algo inato dessas criaturas mágicas.

E ... ainda para completar mais a dúvida, existe o fato, que ignoramos inicialmente, de Dumbledore estar equivocado, o trecho pode ser apenas uma expressão, um jeito de falar, pois, pensando bem, por mais ancião e experiente que seja Dumbledore estamos lidando com datas milenares, seja o encantamento ancestral ou a obediência inerente ambos são muito mais antigos que Dumbledore. :|

Então, acabamos voltando onde estávamos antes (8 comments atrás), no campo das meras hipóteses :? Eu ainda acredito no encantamento ancestral e/ou na hipótese mista (a de 8 comments acima), mas, por enquanto, não podemos concluir nada.
Só se juntarmos todo esse destacamento filosófico e enviarmos para a Jo Rowling hahahahaha.

Até então ótimo debate, espero que ainda sobrem idéias para aprimorar as hipóteses...
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