- Não podia contar mais com as suas pernas. Muito menos com todo o seu corpo. Balançava; tremendo de uma excitação estranha e inexplicável. Em seu rosto, um sorriso fora ensaiado para que saísse de seus lábios, mas estes também não estavam ao controle do bruxo. Tudo fugia de seu alcance, não conseguia controlar a si mesmo. Ainda era cedo demais para sentir qualquer tipo de sensação a qual pudesse alterar o seu estado de espírito atual, afobando – se em suas idéias ainda não confirmadas. Mas as circunstâncias do momento eram as melhores... como um presente divino dos céus, ele estava diante daquele garoto, prestes a ter a chance de recomeçar.
A única luz que iluminava todo o ambiente dos corredores, vindo da ponta de sua varinha, não direcionava – se mais para um ponto específico, como acontecia a minutos atrás. Agora, ela perdia – se em direções, ao teto, ao chão e ao rosto. Sua mão, mesmo que aparentemente saudável – ao contrário da oposta – não conseguia sustentar o peso irrelevante do objeto. Feixes de luz perdiam – se pelos corredores, em um claro momento de total perda de controle por parte do adulto presente naquela cena. Ainda não sabia... mas estava evidente, não? Seus olhos não o enganariam, assim como a sua respiração que começava a ofegar – se gradativamente. Disputaria com o aluno. A tensão sobre ele ainda era maior do que o medo juvenil do estudante. E, o que veio a seguir, apenas contribuiu para a acentuação de suas emoções.
”Feather...”
As palavras que saíram da boca do jovem depois da pronunciação de seu nome entraram como códigos inaudíveis ao ouvido de Ariel. Nada mais importava. Sim, ele estava certo, estava diante de um descendente direto dos... Feather. Os mesmos que, anos atrás, eram os seus companheiros de escola e de outras tantas atividades – as quais contribuíram para a ruína de toda aquela a família, assim como a dele. Jamais imaginou que encontraria alguém com as mesmas características de antes, muito menos dotando a mesma linhagem sanguínea. Seus olhos – e ouvidos – não poderiam acreditar no que estava acontecendo.
Minutos se passaram. Talvez o mais recém descoberto Feather tenha sentido a estranha mudança de comportamento do professor. A varinha pendeu de sua mão, ficando ao simples toque de seus dedos finos, prestes a cair no chão com um baque oco. Suas pupilas dilataram – se , olhando para um ponto fixo na rústica parede a sua frente. Uma vertigem começou a tomar espaço em seu corpo, mas foi facilmente contida pelo bruxo. Aos poucos, retomava a consciência, tendo a surpresa de uma notícia nunca antes esperada, lhe dando um golpe certeiro, jamais sentido anteriormente.
Consentiu silenciosamente, com um breve gesto em relação a explicação vinda do infrator. Mesmo sem ter prestado a mínima atenção ao que saiu de sua boca depois da notícia que realmente o interessava, precisava demonstrar a integridade de um professor severo e ríspido, se é que todo essa atuação já não fora descoberta com perspicácia pelo garoto. Por uma última vez, lançou o jato de luz na direção do rosto do outro, esvaindo – se qualquer ceticismo que povoasse a sua mente. Tudo era verdadeiro; real.
- De qualquer forma, não é hora para detenções, não é mesmo? Venha comigo, vamos a ala hospitalar juntos. Se tiver com problemas para dormir, tenho certeza que a curandeira poderá lhe providenciar uma ótima poção para que possa voltar ao seu devido repouso. Vamos...
A tentativa de Ariel em aproximar o seu tom de voz a algo paternal e - por incrível que pudesse ser - amigável, soou totalmente ridículo. Definitivamente, não tinha nenhuma jeito com relações sociais amistosas, muito menos com crianças. A imagem de seu sobrinho veio logo a sua mente, e a tentação em pedir – lhe alguns conselhos era a opção mais correta que poderia tomar. Não, seria humilhante demais. Por enquanto, levaria tudo ao seu modo, mesmo utilizando – se de métodos pouco eficazes.
Estendeu o braço, empurrando as costas de Daniel com delicadeza – ao menos tentava ser – o indicando o caminho até a ala hospitalar. Retomou a postura, iluminou os corredores com a varinha e lançou um último olhar ao brilho lunar. A passos largos, foi andando; acompanhado pela miniatura de Leyb ao seu lado.
Ala Hospitalar, ‘here we go again’ (8) ~hoho.