Mary, que graça! Você já cresceu, tenha certeza...
Pra vocês não ficarem esperando muito e eu não ficar mexendo demais em coisa que já está pronta, e acabar estragando o que está perfeito (modéstia não é meu forte), resolvi postar mais um capítulo (já inclui até um "momento brega" que acabei não tendo coragem de tirar depois... Mas é o capítulo "song fic" que deu nome à fic.
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Cap. 19 – Primeira manhã de Natal
Um estalo, provavelmente um escapamento na rua, a despertou. Abriu os olhos, instintivamente procurando o berço do filho, onde anteriormente ficava a cama de Renata, que se mudara para Brasília, e estremeceu. À luz de um relâmpago lá fora, pensou ter visto uma sombra, um vulto negro debruçado sobre o berço. Piscou, e não viu mais nada. Olhou o relógio. Cinco e trinta da manhã. Manhã de Natal. Constatou com tristeza que chovia e pensou que, se a chuva não parasse, as crianças não poderiam exibir os brinquedos novos na praça. E evitou pensar que manhãs de chuva sempre lhe pareciam manhãs de Hogwarts.
Aldebaran dormia ainda, por isso permaneceu deitada, olhando para a claridade fraca da janela. Até que a voz de Ivete Sangalo invadiu o quarto, esquecera-se de desativar o despertador do rádio-relógio em sua cabeceira.
“Meu coração / Sem direção,
Voando só por voar / Sem saber onde chegar
Sonhando em te encontrar./ E as estrelas que hoje eu descobri
No seu olhar / As estrelas vão me guiar
Se eu não te amasse tanto assim
Talvez perdesse os sonhos / Dentro de mim
E vivesse na escuridão
Se eu não te amasse tanto assim
Talvez não visse flores / Por onde eu vi
Dentro do meu coração
Regina se levantou, ouvindo os resmungos do filho, que acordara e estava com fome. O leite já escorria mesmo de seus seios que ardiam, molhando o pijama, e ela tentou se convencer de que era essa a única causa da dorzinha chata no peito. Acomodou-se na poltrona de braços, ajeitando o filho em frente ao mamilo, que ele sugou com vontade, fazendo-a sorrir com a pequena fincadinha. A música continuava a tomar conta do quarto e, pela primeira vez, ela se via refletida nos versos tristes de Hebert Viana:
Hoje eu sei / Eu te amei
No vento de um temporal
Mas fui mais / Muito além / Do tempo do vendaval
Dos desejos de um beijo / Que eu jamais provei igual
E as estrelas dão um sinal!
Se eu não te amasse tanto assim
Talvez perdesse os sonhos / Dentro de mim
E vivesse na escuridão ...
As lágrimas rolavam por seu rosto, sem que fizesse qualquer esforço por secá-las. Tentava não pensar muito em Snape, praticamente não entrara mais nos fóruns desde que voltara pra casa, há quase dois meses inteiros. Mas como esquecer aquele homem, se a criança em seus braços era seu retrato fiel? E como negar que cada verso daquela canção lhe cortava mais fundo que um punhal?
Queria desligar o rádio, mas não podia interferir com o ritmo da mamada. Por isso, esperou de olhos fechados que a música terminasse, levando com ela aquele sentimento estranho, aquela sensação de uma presença tão forte que ela parecia evocar. Mas o “DJ” devia estar mais melancólico que ela hoje, pensou, pois colocou em seguida Caetano cantando “Sozinho”.
- Ah, filhinho, mamãe vai ter que desligar essa coisa, ou mudar de rádio... Não dá pra ficar saindo do caldeirão e caindo no fogo! – ela conferiu o relógio, era hora de virá-lo para mamar do outro lado.
O menino resmungou, mas continuou a mamar assim que sua mãe o ajudou a pegar o segundo mamilo, e Regina se resignou, afinal. Que mal poderia lhe fazer uma simples música? Não precisava de ajuda pra sentir o peito cortado pela saudade e pela certeza de que não teria outra chance com o homem mais orgulhoso e intransigente que já existira... Mas tinha o seu filho, o pequeno Aldebaran, que dependia dela. Isso a faria forte.
Ao ver que ele já se cansara de mamar, finalmente, e Regina tentou se erguer lentamente da poltrona. Chegou a ter a impressão de que um braço se estenderia, forte, para ampará-la, mas sacudiu a cabeça. Tinha que parar de imaginar coisas desse tipo. Estava sozinha e continuaria assim. Caminhou lentamente pelo quarto, embalando mansamente o bebezinho apoiado em seu ombro, pequenino. A chuva lá fora se amansara, assim como seu coração. O rádio continuava ajudando muito, ela pensou, agora tinha que ter um Cazuza! Ou, se tivesse sorte...
J Quest! Esse DJ deve ter levado um fora da namorada na ceia de Natal – ela concluiu com um sorriso.
Enquanto os versos de “Amor Maior” invadiam o quarto, Regina suspirou. Parecia que a programação tinha sido escolhida a dedo para atingi-la. Aqueles versos eram bem a cara de Snape:
“Eu Quero ficar só
Mas comigo só
eu não consigo...”
Podia até adivinhar o que viria a seguir, mas antes disso, desligou o rádio. O silêncio era mais seguro. Depois de trocar a fralda do bebê, e niná-lo nos braços um pouco mais, colocou-o no berço.
- Mamãe agora é que precisa se alimentar, malandrinho. Fique quietinho, ouviu? – disse-lhe baixinho, carinhosa, mas ele já dormia de novo. A felicidade morna e calma dos bebês!
Foi ao banheiro, depois pra cozinha. Preparou um grande copo de suco, sempre sentia uma sede imensa depois de amamentar, e espiava pela janela a chuva que ainda caía na manhã nascente, quando o ronco alto de uma moto encheu a rua inteira, quebrando o silêncio e fazendo os cães da vizinhança latirem, alertas.
- Que maluco! – ela pensou – Mal amanheceu! Deve estar voltando de uma noitada, mas não precisava acordar todo mundo... podia ter escolhido passar por outro caminho e nos deixar sossegados.
Ela tentou ver a rua, mas o motoqueiro já saíra de seu campo de visão. Deu de ombros, e foi para seu quarto, procurando uma camisa aberta para vestir, pois o pijama de cetim escuro estampado de luas e sóis risonhos estava realmente bem molhado.
Por um minuto apenas, se examinou criticamente no espelho, antes de vestir a camisa. Os seios aumentados pelo leite, protegidos agora por um sutiã de sustentação que acabara de vestir, que nem por isso deixava de ser uma peça bonita e delicada (presente “bem intencionado” de uma amiga de trabalho). Não engordara tanto, seu corpo já era praticamente o mesmo, com excessão dos seios, claro, mas não conseguia evitar um pouco de insegurança. Será que Snape a acharia grande e feia, se a visse assim? Lembrou-se com um sorriso de uma entrevista antiga de Rita Lee, dizendo que adorava ficar grávida, porque era sua única chance de parecer a Fafá de Belém.
- Eu até que estou parecendo mesmo... – murmurou, sorrindo para seu reflexo – só um pouquinho!
Rindo pra si mesma, imaginando que seria ótimo ter aquele “vozeirão”, cantarolou a primeira música da cantora que lhe veio à cabeça, mas parou bruscamente, sacudindo a cabeça. Não ia melhorar em nada seu astral, ficar cantando
“Abandonada por você...” ou qualquer coisa do gênero. Ainda bem que estava sozinha, ou as amigas cairiam matando por causa do pequeno “momento brega” e ela teria que admitir que tinham razão...além de ficarem preocupadas se ela não estaria entrando em uma depressão pós parto, andando triste daquele jeito ou com crises de insegurança por causa das mudanças no seu corpo...
A campainha da porta interrompeu seu devaneio.
- A essa hora? – pensou, contrariada. Simone e Sinara passavam o Natal com as próprias famílias, e nenhum de seus amigos viria visitá-la às seis da manhã do feriado de Natal! – Só pode ser algum engraçadinho, vou fingir que não ouvi.
Mas, quem quer que fosse, não ia desistir, e insistiu. Agora realmente chateada com a inconveniência, vestiu um camisão amarelo-limão, mal fechando dois botões, impaciente. E abriu a porta, já pronta para xingar quem quer que fosse, pois o olho mágico não ajudou muito, indiferente ao perigo que isso poderia representar.
Mas parou, estarrecida, enquanto um homem se encostava ao batente, sorrindo. Usava jeans e uma jaqueta sobre a camisa meio aberta, tinha os cabelos crescidos, molhados da chuva, a barba por fazer e óculos escuros escondiam seus olhos.
- Não pode ser! – exclamou, dando dois passos para trás. Aquele não podia ser o Tiago! Ele estava morto! Mas claro que não era, pois a fitou curioso, enquanto perguntava, em inglês:
- É aqui a casa do mais novo membro da família Black?
Antes que se recobrasse da surpresa, outra voz, bem mais seca e agressiva, exclamou atrás dela, fazendo-a pular de susto.
- Sirius Black! Eu já estava me perguntando quando é que você iria aparecer!
- Ranhoso! – o outro disse irônico – Eu devia ter imaginado que você estaria aqui, um velho cão nojento guardando o osso!
- O único cão nojento aqui é você, Black.
Os dois homens avançaram um para o outro, varinhas já em punho, como se estivessem sozinhos. Regina, então, pareceu sair do torpor em que se encontrava.
- O que vocês dois estão pensando? – gritou, colocando-se entre eles, arrependendo-se em seguida. Sua fala ecoara pelo corredor vazio, logo algum vizinho curioso estaria espiando de alguma porta mal fechada.
Passou por Sirius, empurrou-o pra dentro e fechou a porta. Depois, encarou os dois homens, que a fitavam ao mesmo tempo que vigiavam um ao outro com o canto do olho. Mas foi Sirius que se recuperou primeiro.
- Ora, fiquei sabendo que ganhei um sobrinho novo... Não se preocupe, foi Dumbledore que me contou, e não pude deixar de vir visitá-la e conhecer o menino... Embora alguns pareçam acreditar que já faço isso com freqüência, não é, Ranhoso?
Regina fitou Snape. Ele parecia pronto a atacar o outro, mas respirou fundo e olhou pra ela.
- Eu só queria... trazer um presente de Natal pro meu... pro sobrinho de McGonagall, mas vejo que escolhi uma hora imprópria. Adeus.
Dizendo isso, desaparatou, sem que Regina tivesse a chance de pedir que esperasse. Desalentada, deixou-se cair no sofá, enquanto Sirius a observava.
- Desculpe, não tive a intenção. – ele disse, depois de algum tempo, sentando-se ao seu lado – Como me disseram que ele nega ser o pai, não imaginei encontrá-lo aqui... Você podia ter escolhido melhor o pai de meu “sobrinho”!
- Tudo bem – Regina sacudiu a cabeça, e enxugou as lágrimas com a costa da mão – Se você não tivesse chegado, era capaz dele ficar aqui o dia inteiro, me assombrando.
- Como assim?
- Não viu a capa na mão dele? Estava aqui, há algum tempo já, só que invisível, o... – ela não conseguiu achar um nome para xingá-lo, que expressasse realmente a raiva que sentia por ele ter feito isso. – O Ranhoso!
Mas teve que reconhecer. Isso era tão próprio dele, que ela mesma imaginara em sua fic. Que ele a vigiasse com uma capa de invisibilidade!
Sirius riu, ao ouvir seu desabafo. E só então a examinou com atenção. Era bonita, tinha os cabelos muito negros e a maternidade provavelmente acentuara suas formas. Será que Snape percebera aquela aura de força e sensualidade que a envolvia? Não, ele não tinha tal sensibilidade!
Mas Regina agora também fitava o primo, ou seria tio? Não sabia exatamente o grau de parentesco entre eles. Mas, com certeza, era como se visse Tiago à sua frente, e isso a feriu mais ainda, fazendo-a recuar, instintivamente.
- Ei, o que é isso? – ele tocou seu rosto, e ela estremeceu – Não precisa ter medo de mim, o lobisomen da turma é outro!
Regina se viu obrigada a sorrir, ao se lembrar de Lupin. Mas fitou Sirius com o olhar dolorido, vendo-se forçada a explicar:
- É que... conhecia alguém muito parecido com você. Mas ele morreu. Como, aliás, você, até onde eu sei...- tinha se esquecido completamente de que Minerva lhe contara que ele voltara do véu - Mas não me conte! Não quero ser tentada a colocar a “teoria” no fórum e depois ter que responder a perguntas embaraçosas tipo:
“como você sabia?”
- Desculpe – ele riu – Dumbledore me preveniu sobre isso, disse que você poderia ficar chocada, mas eu tinha que vir. Tinha que me certificar por mim mesmo de que isso tudo não era um delírio dele.
Ele viu o cordão de ouro em seu pescoço, onde o relicário com a pena de Fawkes brilhava, e o pegou entre os dedos.
- Como conseguiu esta corrente? – perguntou, examinando o fecho, reconhecendo prontamente o brasão que continha.
- Era dele... do Tiago – Regina falou com voz fraca, tentando ignorar a sensação estranha de que era Tiago mesmo à sua frente, seus dedos quentes roçando a pele do seu pescoço, afastando perigosamente o decote de sua camisa ao examinar o cordão.
- Sei... – Sirius a olhou com expressão estranha, quase assustadora – Você tem alguma foto dele? Se você diz que se parecia tanto comigo, gostaria de conferir.
- Foto dele? – ela não entendia direito o que ele dizia, mas respondeu – Na verdade, tenho uma fita de vídeo.
Enquanto lhe perguntava se já assistira filmes feitos pelos trouxas, mais tranqüila por ele saber do que se tratava, procurou a velha fita. Ainda hesitou, mas ligou o vídeo e a tv e sentou-se novamente ao seu lado, não muito perto, pois as reações de seu corpo a estavam assustando de verdade. Quase adiantou a fita, mas preferiu ter tempo para se preparar, vendo tudo, enquanto explicava:
- Isso foi gravado num fim de semana, no sítio de uns amigos. Nossa turma era bem unida, na época. Este que está filmando é o Vinicius, seria bem o “Potter” da turma. Mas é melhor você ver por si mesmo.
Enquanto a fita corria, a cena da sala, a cozinha, Regina o examinava disfarçadamente, medindo suas reações. Ele agora se projetara para a frente, apoiando os braços nos joelhos, e ela resistiu à tentação de mexer em seus cabelos.
“- Rê! Olha pra cá!” – a voz de Vinicius a fez voltar à realidade. Sirius parecia mais concentrado ainda, assistiu à sua dança com Tiago, sem ao menos piscar. Na seqüência, os rapazes admiravam a moto nova, que Tiago descrevia com entusiasmo.
- Dá pra parar a imagem? – Sirius perguntou.
- Claro, é só falar quando...
- Aí... Pronto. – ele se aproximou da tela, examinando com atenção o que parecia ser ele mesmo aos 20 anos.
Depois, se virou para uma Regina cada vez mais confusa, perguntando:
- Como se conheceram?
- Ora, fomos vizinhos... a vida toda – ela não queria se lembrar disso, que a vida toda para ele fora apenas 20 anos. – ele morava na casa ao lado da minha. Por que?
- E você? Quem foi mesmo que a trouxe pra cá?
- Aníbal Black, meu avô. Quer ver a carta dele? Eu só descobri há pouco tempo...
- Por favor.
Regina foi para o quarto, seguida por Sirius, que sentou-se em sua cama, sem cerimônias. Com um suspiro e um olhar aflito para o berço, temendo que o bebê acordasse, ela lhe estendeu o velho pergaminho. Sirius o leu com atenção, depois examinou tudo que tinha no malão, que ela apontou como sendo de Aníbal.
- O você entendeu aqui, quando ele diz
“tomar conta de vocês”?
- Ele falava de mim e de minha família, não? Ele conseguiu que mamãe confiasse nele, depois da morte de papai, e sempre foi um amigo precioso pra todos nós. Todos o chamávamos de “vô”, inclusive Tiago e as outras crianças da rua.
- Não necessariamente... – Sirius suspirou – O que praticamente ninguém sabe, é que tive um irmão.
- Claro, Regulus. Eu sei – Regina retrucou.
- Não, não esse irmão – ele sorriu tristemente – Tive um gêmeo. Sirius é uma estrela binária, não sabia?(*2)
Regina deixou-se cair ao seu lado. Aquilo era impossível! Tiago... não podia... não era...
- Meu irmão? – Sirius sorriu – Sua corrente é a prova de que sim. Veja isso. – ele levou a mão ao seu próprio peito, deixando-a ver uma corrente de ouro idêntica à que usava, aproximando-as e comparando o brasão no fecho de ambas – Não sei os detalhes, só sei que ele não possuía nenhum poder mágico, os Black tinham como detectar isso, não se espante. É um método doloroso para a criança, acredite, mas minha querida mãe não hesitou em usá-lo, em todos os filhos. Não podia se arriscar a ter um aborto na família...
A amargura de Sirius era palpável. Em voz baixa, respeitando o sono de Aldebaran, explicou que soube que seu pai pedira seu primo Aníbal para levar o garoto para um lugar seguro, usando uma chave especial, em poder dos Black há séculos. Ele cresceria como uma criança normal, num mundo diferente do que eles conheciam. Mas Sirius só soube disso na véspera da morte dos Potter. Então, mesmo que tivesse podido tentar algo, já não o alcançaria com vida... ele já estava morto. Seu pai soubera de sua morte, pelos Prewet, pouco antes deles morrerem também, embora eles só tivessem comentado que haviam encontrado um rapaz que era a sua cara, ao prestar um pequeno favor ao velho Aníbal e ele desconfiara...
- Meu Deus! – Regina não conseguia acreditar. Só podia ter ficado louca de vez! Nada daquilo estava acontecendo. Psicose pós-parto. Era isso! Estava tendo um surto, com dois meses de atraso, e sonhando aquela loucura toda!.
- Você sabe qual era o nome dele? O nome de família? – ela perguntou num fio de voz.
- Sei. – Sirius respondeu, depois de alguns segundos – Não se pode nomear crianças gêmeas como os astrônomos nomeiam estrelas binárias. Sirius A, Sirius B. É ridículo! Meu pai o chamou de Aldebaran.
Regina o fitou assustada. Não era possível que fosse verdade!
- O que foi? – Sirius ficou preocupado.
- Aldebaran... era o nome de uma música que ele cantava pra mim, de vez em quando. E foi o nome que escolhi para meu filho. Aldebaran Alan Black, é como se chama, pelo menos até ser reconhecido pelo pai.
Ela olhou para o filho, tão pequenino, dormindo tranqüilamente em seu berço, e pensou que o destino lhe reservara surpresas fabulosas...
Mas Sirius se recostou na cabeceira da cama, subitamente cansado, e ela teve pena de seu desespero mudo. Aproximou-se dele, e pegou sua mão, como a dizer que entendia e partilhava sua dor. Tiago fora seu primeiro amor de verdade, sentira muito a morte dele, a ponto de quase não se recuperar...
Então, aconteceu. Exatamente como há mais de vinte anos, com Tiago. Ele a fitou longamente, depois, sem dizer nada, a puxou delicadamente para si e a beijou. A princípio, surpresa, Regina tentou se esquivar, mas caiu sobre ele e, tomada por uma sensação de conforto e reconhecimento presa em seu abraço, correspondeu, até que sua mente gritasse o alarme:
- Este não é o Tiago! É o Sirius! – assustada, afastou-se, ofegante. Em seus olhos, havia uma dor maior que a dele, agora. E o anel em seu dedo queimava.
- Agora ele tem um motivo...
- Hein? – ela o olhou sem entender, ainda tonta com o que acontecera.
- Ranhoso. – Sirius soltou uma risada seca, apontando o anel – Este anel é mais eficiente que qualquer “cinto de castidade”... – Regina corou, mas Sirius completou com ar de quem estava torcendo pra ver o outro aparatar na sua frente - Ou ele volta aqui em dois segundos, ou nunca mais. Acho que estraguei de uma vez por todas suas chances com ele.
- Mais do que já estava? Impossível... – ela retrucou com amargura.
Sirius tentou abraçá-la novamente, mas Regina se esquivou, levantando-se e voltando à sala.
Precisava por ordem em seus pensamentos, em seus sentimentos. Quando Sirius se aproximou e segurou seus ombros, ela sussurrou, meio confusa:
- Se eu tivesse... chegado a Hogwarts... um ano antes, talvez isso fosse diferente.
- Como assim? – ele a fez se voltar para olhar em seus olhos, mas ela baixou o rosto.
- Antes... de você sumir naquele véu, e todo mundo pensar que estava morto... Eu ainda poderia... amar você. Ainda não me interessara de verdade por Snape. Mas, mesmo assim, poderia estar apenas vendo em você um reflexo dele, do Tiago. Não seria justo, nem pra mim, nem pra você.
Em silêncio, ele a abraçou, deixando que soluçasse contra seu peito por alguns minutos. E não a soltou enquanto ela não parou de chorar.
- Ei, não fique assim, gata! – ela estremeceu e ele a fitou, interrogativo – O que foi?
- Era assim... que ele me chamava... Está vendo? Eu nunca... imaginei que isso fosse acontecer um dia. – ela o fitou com os olhos rasos d’água – E mesmo torcendo por você nos fóruns, imaginando mil teorias pra provar que você sairia daquele véu maluco, eu no fundo tinha medo disso, depois que vi o filme. O Gary Oldman se parece realmente com você... com Tiago. Principalmente depois que... descobri que Harry Potter, Hogwarts e tudo o mais não eram simplesmente a criação salvadora de uma escritora desempregada. Eu tinha medo de encontrar você de verdade e... pensar que fosse Tiago! E transferir para você o que sentia por ele... como aconteceu agora... Isso não está certo!
- Sinto muito... – ele parecia sincero – Eu devia ter mandado uma mensagem pra você. Pelo Lupin, talvez, ou pela McGonagall, prevenindo-a de que viria e lhe dando tempo para se preparar. Não sou nada modesto, hein? – ele riu por um momento - Dumbledore me advertiu, mas, como sempre eu não escutei. Fui inconseqüente e leviano, ainda mais agora que você está tão... fragilizada, por causa daquele idiota do Snape! Me perdoe, sim?
Ele ergueu seu queixo, examinou seu rosto, seus olhos molhados. Ela não sabia, mas estava linda assim, e ele, poxa... como iria resistir a isso? Beijou-a novamente com imensa ternura. Regina se deixou beijar, imaginando que, pelo menos desta vez, podia se despedir de verdade de seu antigo amor, fosse ele Tiago ou não. Porque, no fundo de seu coração, percebia agora, claramente, que nem mesmo Sirius Black lhe arrancaria fora aquele sentimento que parecia uma doença: seu amor louco e sem futuro por Severus Snape.
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(*2) - esta edição é mais científica, gente. recentemente descobri que os astrônomos já constataram que Sirius é uma estrela TERNÁRIA, na verdade. isso mesmo, descobriram uma terceira estrela perfeitamente escondida pela sombra da grande e luminosa Sirius (o engraçado que isso já era dito há décadas em um romance espítia: "Renúncia", autor espiritual Emmanuel, psicografado por Chico Xavier)